Sílvio Santos Vem Aí é parte de um material irresistível: os bastidores do maior comunicador da televisão brasileira, justamente no momento mais inesperado de sua carreira, que foi sua candidatura à presidência da República em 1989. É uma premissa que, por si só, já carrega drama político, memória afetiva e a aura enigmática de um apresentador que sempre soube controlar sua própria narrativa. No entanto, o longa opta por um caminho mais seguro, priorizando a relação fictícia entre Silvio e Marília, uma jornalista convocada para “investigá-lo” e blindá-lo de ataques.
Essa escolha narrativa tem seus méritos. Ao colocar Manu Gavassi no papel de Marília, o filme tenta criar um ponto de entrada contemporâneo, alguém que olha para Silvio com distância crítica antes de ser lentamente absorvida por seu carisma, exatamente como aconteceu com o público brasileiro ao longo das décadas. A dinâmica entre os dois sustenta boa parte da história: embates éticos, desconfiança mútua e, por fim, um processo de transformação que humaniza ambos.
O grande risco — e também o fascínio — do filme é lidar com Silvio Santos como personagem. Vivido por Leandro Hassum, o apresentador aparece como alguém reservado, complexo e surpreendente. Essa abordagem evita a caricatura fácil e tenta mostrar camadas de um homem que sempre foi maior do que os rótulos que o cercam. Ainda assim, é possível sentir que o filme hesita em ir mais fundo. Há uma reverência evidente que impede o longa de explorar as contradições, conflitos e polêmicas que dariam mais potência dramática à obra.
Do ponto de vista cinematográfico, Sílvio Santos Vem Aí parece apostar mais na reconstrução do ambiente televisivo — com seus bastidores, tensões e rituais — do que na investigação política e histórica que o contexto de 1989 permitiria. Para um período de tamanha turbulência no Brasil, o filme aparenta tocar apenas superficialmente o momento, usando-o como cenário e não como motor dramático.
Ainda assim, há algo inegavelmente sedutor na proposta. O mundo dos programas de auditório, com sua estética única e sua lógica própria, é terreno fértil para boas histórias. Quando o filme se concentra nesse universo, ele encontra ritmo, humor e espontaneidade. É na relação entre comunicador e público — filtrada aqui pela figura de Marília — que a obra funciona melhor.
No fim, Sílvio Santos Vem Aí agrada pelo carisma natural do retratado e pela tentativa de oferecer um olhar íntimo sem cair no tom hagiográfico absoluto. Não é um mergulho profundo na figura de Silvio nem um drama político de grande fôlego. É, antes, um filme confortável, que aposta na memória afetiva e no magnetismo de seu protagonista para envolver o espectador.